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Região de Rio Preto terá aumento de até 4,8ºC na temperatura e temporais mais fortes até 2050



Aumento de até 4,8 graus na temperatura, redução do número de chuvas, temporais mais frequentes e ondas de frio cada vez mais intensas. Esse é o cenário para a região de Rio Preto até 2050, caso ações para mitigar os efeitos das alterações climáticas não sejam adotadas.

O estudo inédito do governo de São Paulo com a Secretaria de Meio Ambiente de Rio Preto obtido pelo Diário aponta que as mudanças climáticas são o principal desafio da humanidade nos próximos anos. E assim, como defendeu o ex-presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, em 2015: “somos a primeira geração que sente as consequências das mudanças climáticas e a última que tem a oportunidade de fazer algo para deter isso”.

O cenário alarmante apontado pelo estudo regional vai ao encontro das projeções realizadas pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), que mostram um aumento da frequência de eventos climáticos extremos no planeta.

Para se ter uma ideia, antes da Revolução Industrial - século 18 -, esses eventos extremos aconteciam uma vez a cada 10 anos, hoje, em um mundo 1,1 graus mais quente já ocorrem quase três vezes a cada década. É o caso, por exemplo, da pior crise hídrica dos últimos 91 anos no Brasil, que fez represas secarem e diversas cidades da região de Rio Preto decretarem racionamento de água, no ano passado.

No entanto, os riscos climáticos não devem ficar restritos apenas ao aumento da temperatura e estiagens cada vez mais longas. Como um efeito dominó, pesquisadores apontam para aumento de doenças respiratórias, casos de dengue e extinção de espécies de animais, que podem não sobreviver à alta temperatura no Noroeste Paulista nos próximos anos. Além disso, a forte agricultura da região, com a falta de água pode ter maior dificuldade na produção de alimentos desencadeando um aumento progressivo no preço de produtos básicos, como arroz e feijão.

Segundo o coordenador de planejamento ambiental da Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente do Estado de São Paulo (Sima), Gil Scatena, as projeções foram realizadas, com base em relatório do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), com objetivo de preparar o Estado de São Paulo para enfrentar e mitigar os efeitos das alterações climáticas.

“No caso da região de Rio Preto, as projeções apontam para no melhor cenário um aumento de 3,5 graus na temperatura e 4,8 graus no pior cenário. Historicamente, essa região já é uma das mais quentes do Estado e junto com Ribeirão Preto, Franca, Barretos, Araçatuba e Bauru devem ter o maior aumento de temperatura nos próximos anos do Estado”, disse Scatena.

Entre os fatores que ajudam a temperatura subir na região está a do Noroeste Paulista ter a menor cobertura vegetal do Estado de São Paulo e as tradicionais queimadas, entre junho e outubro, que pioram a qualidade do ar.

“Esse aumento de temperatura na região de Rio Preto, pode ter impacto ainda maior na qualidade de vida dos munícipes, com regiões mais quentes que outras. Em São Paulo, por exemplo, sabemos que a diferença de temperatura pode chegar a 10 graus na região central do que em bairros da região Norte”, falou.

O biólogo e assessor da Secretaria de Meio Ambiente de Rio Preto, Alexandre do Carmo, também aponta que da mesma forma que acontece na região, Rio Preto possui um percentual baixo de arborização urbana. De acordo com o Inventário Florestal 2020, a cidade possui apenas 8,7% de cobertura vegetal nativa.

“As árvores têm um papel fundamental quando falamos em alterações climáticas, pois elas possuem o poder de contribuir na mitigação dos efeitos sentidos pelos riscos climáticos apontados. A sombra delas proporciona uma redução de até quatro graus na temperatura do ambiente em comparação com as áreas em exposição direta à luz solar”, disse.

Além disso, segundo Carmo, as árvores estimulam a infiltração e a absorção de água no ambiente urbano. “Uma árvore adulta, pode absorver do solo até 250 litros de água por dia, e pensando que nossa área urbana possui alta taxa de impermeabilização, essa absorção contribui para a redução do risco de inundações, enchentes e erosões”.

Extremos

O estudo também aponta para o aumento de eventos climáticos extremos na região de Rio Preto. Ou seja, períodos de seca cada vez mais severos e ondas de frio mais intensas. A estação meteorológica da Unesp de Ilha Solteira, que faz a medição da temperatura, desde a década de 1990, apontou que, em outubro de 2020, os termômetros marcaram 44,6 graus, temperatura nunca antes registrada na região desde que a aferição começou a ser realizada. Em contrapartida, em julho do ano passado, Santa Salete marcou -3,7 graus.

Stela Herschmann, especialista em Política Climática do Observatório do Clima, aponta que estudos já comprovam que a ação humana é a principal causadora das alterações climáticas e alerta: “O relatório do IPCC já aponta que não temos mais uma porta inteira de possibilidades para mitigar os efeitos das alterações climáticas, mas apenas uma fresta. Essa é a década crucial para colocarmos em prática as ações. Temos que enfrentar as mudanças climáticas ao mesmo tempo que nos adaptamos a ela”.

Cidades se preparam para alterações no clima

 

Da mesma que é o responsável pelas alterações no clima, especialistas defendem que também é necessário vir do homem as únicas atitudes para mitigar os efeitos climáticos nos próximos anos. A primeira delas é o incentivo de políticas públicas que estimulem os brasileiros a adotar práticas sustentáveis.

“O uso inteligente dessas informações vão ajudar as prefeituras a traçar políticas públicas como forma de mitigar os efeitos climáticos. Rio Preto, por exemplo, precisa aumentar a arborização da cidade, que é uma das menores do Estado, mas a prefeitura já mostrou alguns projetos para estimular isso, como criação de parques, estímulos da arborização nos lotes e até incentivo no IPTU para quem tem área arborizada”, apontou Gil Scatena, coordenador de planejamento ambiental da Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente do Estado de São Paulo (Sima).

Segundo a secretária de Meio Ambiente e Urbanismo de Rio Preto, Kátia Penteado, a cidade está elaborando o Plano Municipal de Adaptação e Resiliência à Mudança do Clima, como forma de planejar as melhores estratégias. O plano deve ser lançado nas próximas semanas. Isso porque agora, a pauta das alterações climáticas não é apenas da Secretaria do Meio Ambiente, mas envolve todas as pastas municipais, iniciativa privada, sociedade civil e o terceiro setor.

“As alterações climáticas não tem volta, o que podemos é agir para diminuir seus impactos. Estamos vivendo um momento de emergência climática. A temperatura já está subindo, já estamos percebendo a redução das precipitações e sentindo seus efeitos. As ações de educação ambiental são de suma importância para que possamos trazer aos munícipes, o conhecimento base e as medidas necessárias em apoio a causa ambiental”, afirmou Kátia.

Entre as metas pré-estabelecidas que estão sendo discutidas para serem incluídas no Plano Municipal de Adaptação e Resiliência à Mudança do Clima, está que em 20 anos, Rio Preto possa ter uma cobertura vegetal no perímetro urbano de até 50%, o que corresponderia ao plantio de árvores em 6.300 hectares em perímetro urbano.

“O município ainda não possui um Inventário de emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE) e esse instrumento é essencial para que possamos quantificar nossas emissões e assim pensar sistematicamente a questão. Porém, necessitamos da contratação de uma equipe especializada para tal realização, o que demanda recursos financeiros. Mas adiantamos que esta é uma das medidas consideradas no plano que estamos concluindo”, destacou Alexandre do Carmo, biólogo e assessor da Secretaria de Meio Ambiente de Rio Preto.

Para o especialista em política climática do Observatório do Clima, Stela Herschmann, é importante também pensar as políticas de mitigação dos efeitos climáticos na esfera da desigualdade. “Normalmente, a população mais vulnerável é quem acaba pagando o preço mais caro. E, muitas vezes, com ocorrências de morte. É necessário colocar em prática ações para mitigar esses efeitos das alterações climáticas de forma urgente, pois reverter não existe mais possibilidade”, disse.

Já o professor do departamento de ciências biológicas do Ibilce, Fernando Barbosa Noll, defende pensar essas ações em conjunto com a tecnologia. “Não dá mais para continuar consumindo tanto combustível fóssil, depender de represamento de água para gerar energia elétrica, precisamos investir na captação de energia solar, na agricultura familiar e incentivar agroflorestas. No passado, quem falava de preservação do meio ambiente como forma de reverter os riscos climáticos era classificado meio como lunático, hoje, muita gente sabe da importância da preservação, pois já começa a sentir na pele”. (RC)

Mais doenças e extinção de espécies

 

Ao mesmo tempo que eleva a temperatura na região de Rio Preto, também deve crescer o número de doenças. Uma pesquisa divulgada, no ano passado, na revista The Lancet Regional Health – Americas, a partir de uma parceria entre a Universidade de Monash, em Melbourne, na Austrália, e o Instituto de Estudos Avançados (IEA), da Universidade de São Paulo (USP), apontou que em 15 anos, o aquecimento global causou mais de 200 mil casos de doença renal no Brasil.

O estudo avaliou mais de 2,7 milhões de hospitalizações por algum tipo de doença renal, entre os anos 2000 e 2015, em 1.816 municípios brasileiros, entre eles, Rio Preto, mostrando que as variações de temperatura extremas em um mesmo dia podem afetar o organismo e desencadear doenças renais.

Contudo, doenças conhecidas dos moradores do Noroeste Paulista, como a dengue, também devem aumentar exponencialmente com o aumento da temperatura. “A dengue é uma doença tropical, então quanto maior a temperatura, melhor para o Aedes aegypti. Ao mesmo tempo, quanto mais concentrada as chuvas, como prevê os estudos, mais poças de água e ambientes propícios para a reprodução do mosquito. O cenário mostra que ao invés de dengue só nos períodos de chuva, teremos alta do número de casos de dengue o ano todo”, apontou o professor do departamento de ciências biológicas do Ibilce, Fernando Barbosa Noll.

Ele também aponta para o risco de extinção de espécies, como já vem acontecendo em diversas partes do mundo. “A gente fala que todos os seres vivos estão em constante evolução, mas isso não é no sentido de melhoria, mas de sobrevivência. Quando a gente fala de um aumento de quase cinco graus na temperatura regional, isso pode provocar uma morte em massa de diversas espécies de animais e até plantas”. (RC)


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