O julgamento de um caso de homicídio no Tribunal do Júri de Pirapozinho, interior de São Paulo, foi suspenso na última sexta-feira, 8, após advogados de defesa deixarem o plenário em meio a desentendimentos com o promotor de Justiça. A juíza Renata Esser de Souza, responsável pela sessão, interpretou a saída como abandono injustificado e determinou a aplicação de multa por litigância de má-fé a seis advogados, fixada em 20 salários-mínimos para cada um, com o objetivo de ressarcir o custo processual gerado pela interrupção.
A controvérsia teve início quando, segundo relatos presentes em ata, o advogado Caio Percival teria comentado informalmente com seu assistente que daria uma "surra" no promotor Yago Lage Belchior, que atuava na acusação do caso. O comentário foi ouvido pela juíza e pelo próprio promotor, levando à suspensão temporária do julgamento para evitar escalada no conflito.
Em resposta ao episódio, o procurador-geral de Justiça de São Paulo, Paulo Sérgio de Oliveira e Costa, emitiu nota de apoio ao promotor, classificando a declaração como uma afronta à civilidade esperada entre membros do sistema de Justiça.
Em nota pública, o escritório de advocacia Percival e Advogados Associados, que representa a defesa, afirmou que o comentário feito por Caio Percival foi distorcido e utilizado para justificar o que chamaram de "reação desproporcional" por parte do promotor.
Segundo o escritório, o promotor teria adotado, desde o início do julgamento, uma postura considerada xenofóbica, insinuando aos jurados locais que os advogados, que vieram de Curitiba, não seriam confiáveis.
A defesa também alegou parcialidade na composição do júri, mencionando que a lista de jurados não estaria sendo renovada conforme a legislação, e informou ter solicitado a intervenção da OAB para que uma auditoria seja realizada.
A situação no tribunal foi ainda agravada por relatos de que jurados teriam se sentido intimidados, levando a juíza a requisitar reforço policial para a continuidade do julgamento. No entanto, diante do clima tenso e das dúvidas sobre a imparcialidade dos jurados, os advogados optaram por deixar o plenário, argumentando que a continuidade da sessão comprometeria o direito de defesa do réu.
Leia a nota do MP/SP:
NOTA PÚBLICA
Em defesa de atuação do promotor do Júri Yago Lage Belchior
Mais uma vez, esta Procuradoria-Geral de Justiça vê-se impelida a externar o seu repúdio ao comportamento de patronos de réus levados às barras do Tribunal do Júri para responder pelo crime de homicídio. Nesta sexta-feira (8/11), um advogado, conversando com seu assistente, disse em plenário que daria uma "surra" no promotor de Justiça Yago Lage Belchior. O comentário afrontoso e pseudo-intimidador foi ouvido pela juíza que dirigia os trabalhos, que acabou multando os defensores por litigância de má-fé. Isso após eles se retirarem de plenário e impedir o prosseguimento do julgamento. O comentário caracteriza-se como afrontoso na medida em que joga por terra os princípios da civilidade e lhaneza que devem imperar entre aqueles que integram o sistema de Justiça. E caracteriza-se como pseudo-intimidador na medida em que o seu efeito sobre o intimorato membro do MPSP é nulo. Assim, deve ficar claro que o promotor da comarca de Pirapozinho, como seus colegas das outras comarcas do Estado, não vai retroceder um só milímetro na sua missão de proteger o bem jurídico mais valioso que existe: a vida. E para tanto todos eles contam com o irrestrito apoio do subscritor desta nota!
São Paulo, 8 de novembro de 2024
PAULO SÉRGIO DE OLIVEIRA E COSTA
PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA
Leia a nota do escritório:
Diante das graves acusações e da conduta inadequada do promotor de Justiça, o escritório Percival e Advogados Associados vem a público esclarecer os fatos ocorridos no Fórum de Pirapozinho no dia 08 de novembro de 2024.
O comentário atribuído ao advogado, feito em tom informal e privado, foi utilizado de forma distorcida para justificar uma reação desproporcional do promotor, que, desde o começo do julgamento, buscava de modo xenofóbico colocar os jurados de Pirapozinho contra os Advogados que eram de Curitiba. O discurso do outro, do estrangeiro, do diferente, do forasteiro, em qualquer circunstância, deflagra o ódio divisor dos homens, devendo ser prontamente repelido.
Noutro giro, a afirmação do promotor em plenário de que o julgamento já era seu e que todos os jurados estavam com ele, aliada às informações privilegiadas sobre o relacionamento próximo entre o promotor e alguns jurados, levanta sérias dúvidas sobre a lisura do processo, sobretudo porque a lista geral de jurados não vem sendo atualizada anualmente como determina a lei. Neste ponto, a OAB paulistana já foi acionada para realizar a devida auditoria no fórum para impedir julgamentos parciais pelos mesmos jurados.
Já sobre a decisão da juíza de aplicar uma multa por litigância de má-fé, sem considerar as evidências de parcialidade, demonstra uma clara violação ao direito de defesa e ao devido processo legal. A busca por justiça exige que todos os envolvidos em um processo judicial atuem de modo livre e imparcial.
No caso, a defesa teve que pedir a dissolução do conselho de sentença após uma das juradas reportar à Magistrada Presidente da sessão que queria reforço policial por medo, o que por certo maculava sua livre apreciação dos autos. Não restou outra alternativa à defesa senão abandonar o plenário em busca da preservação dos direitos do acusado.
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